Tecnologia na relação de emprego: usar ou não usar?

O Tribunal Superior do Trabalho   tem a  Súmula  428, a qual trata do tema Sobreaviso:

Súmula nº 428 – TST– Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011 – Conversão da Orientação Jurisprudencial n.º 49 da SBDI-1

Sobreaviso – Uso de Aparelho de Intercomunicação – Convocação para o Serviço

O uso de aparelho de intercomunicação, a exemplo de BIP, “pager” ou aparelho celular, pelo empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço.

 

Evidencia-se que a Súmula 428, foi editada com o intuito de esclarecer, que apenas o uso de algum tipo de aparelho de intercomunicação não poderia configurar a modalidade de regime de sobreaviso e sim a efetiva prova de que estaria em sobreaviso. Entretanto, com o advento da Lei 12.551 de 2011, tem-se que o trabalho realizado em casa e/ou na sede do empregador, são, para efeitos legais, equiparados.

O intuito da norma legal que alterou o artigo 6ºda Consolidação das Leis Trabalhistas, tem o escopo de acompanhar as tendências tecnológicas e de relação de emprego que podem existir em virtude do  novo horizonte que a informática e demais segmentos de tecnologia impingem ao relação empregador x empregado.

O artigo 6 º  tenta regulamentar o trabalho a distância, sendo que em sua antiga redação já havia a igualdade entre o trabalho realizado no domicilio do empregado do estabelecimento do empregado, vejamos a redação antiga:

Art. 6º – Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador e o executado no domicílio do empregado, desde que esteja caracterizada a relação de emprego.

Já na redação nova com a modificação imposta pela Lei n°12.551 :Art. 6o Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.

Incólume restou no artigo 6º da CLT que o objeto que se quer proteger é a relação de emprego seja ocorrendo no estabelecimento do empregador, no domicilio do empregado ou a distância,deste modo, o empregador que disponibiliza ao empregado equipamentos eletrônicos, com o intuito de propiciar facilidades ao trabalho, durante a jornada e/ou após o término da jornada, terá reconhecido este período como tempo à disposição do empregador e, dependendo da modalidade da contratação, arcará com o pagamento de horas suplementares.

Diante da constatação de que o bem jurídico que se quer preservar é a relação de emprego, seja onde ocorrer e da forma que ocorrer, temos que acautelar-se quanto a real necessidade de revisar a Súmula 428 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), a qual entende que “o uso de aparelho de intercomunicação, a exemplo de BIP, “pager” ou aparelho celular, pelo empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço”. Neste particular, o Ministro João Oreste Dalazen, ressalta que “a entrada em vigor da nova lei torna “inafastável” a revisão da Súmula nº 428, e adianta que pretende promover uma semana para que os 27 ministros da Corte discutam os vários aspectos envolvidos na nova realidade” [FONTE TST].

O TST publicou a seguinte notícia em seu site:

Lei federal sobre trabalho a distância exigirá mudança na jurisprudência do TST

No entendimento do Presidente do TST , o  Ministro João Oreste Dalazen cita que a Lei 12.551 afeta diretamente os casos em que o empregado, depois de encerrada a jornada, fica à disposição para atender um novo serviço para a empresa. A Súmula 428 não considerava esse tempo de espera como tempo de serviço, mas a lei o conta como tal. Com isso, a súmula se tornou incompatível e terá de ser reavaliada pelos ministros. Ainda Dalazen proferi o seguinte questionamento: Não há dúvida de que o serviço prestado a distância pode configurar relação de emprego, mas como será nos casos em que um empregado não trabalhar a distância, mas permanecer à disposição do empregador, portando um celular? Será que esse empregado deve ser remunerado da mesma forma quando o serviço é prestado ininterruptamente?  Nesses casos, teremos de considerar pelo menos três hipóteses. A primeira seria a de que o tempo à disposição da empresa deve ser remunerado como de sobreaviso. Se esse entendimento prevalecer, o trabalhador receberia pelo período, à equivalência de um terço do salário. A segunda hipótese seria a de considerar o tempo como hora normal de trabalho, e a terceira seria a de simplesmente não pagar por ele.Fonte: sitedo TST

Em que pese o entendimento do Excelentíssimo Ministro João Oreste Dalazen que há necessidade da revisão da Súmula 428, ouso discordar, porquanto, que o enfoque que a Lei 12.551 de 2011  quis acrescentar na legislação trabalhista com a devida alteração do artigo 6º, não altera substancialmente a Súmula 428 do TST.

Denota-se que a revisão ou a manutenção do verbete dependerá da interpretação que se empreste à nova redação do art. 6º da CLT.

Saliento que segundo alguns entendimentos, o trabalho realizado à distância passou a ser considerado como tempo a disposição da empresa, a partir da nova redação do art. 6º da CLT, porém, podemos considerar que existindo  os seguintes requisitos de pessoalidade, habitualidade , com onerosidade e subordinação, sempre pode ser considerado relação de emprego , nos termos da interpretação conjugada dos artigos 2º, 3º e 4º da CLT.

Mister se faz,  que mesmo antes da alteração do art. 6º da CLT, vários teletrabalhadores subordinados (pelos meios telemáticos a que se reporta a novel redação) foram reconhecidos como empregados, e a eles foi estendida a proteção trabalhista.

Nos reportando a doutrina trabalhista  que preceitua: que o trabalhador que exerce suas atividades na residência e/ou em localidade diversa da sede do empregador não terá prejudicada a relação de emprego.

Utilizando da interpretação teleológica,teremos que a Súmula 428 do TST não trata propriamente de trabalho realizado à distância, mas tão somente da possibilidade de manutenção do trabalhador conectado, por meios tecnológicos, às necessidades do empreendimento/empregador.  Vejamos o verbete:

O uso de aparelho de intercomunicação, a exemplo de BIP, “pager” ou aparelho celular, pelo empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço. Conclui-se que enquanto a súmula 428 do TST trata sobre o sobreaviso, o art. 6º da CLT  prevê a possibilidade de vinculo empregatício existente no trabalho a distância.

Analisando o parágrafo único do art. 6º que considera “os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e  supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio” temos a intenção do legislador em equiparar os meios novos existentes aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão. Ou seja, a norma jurídica impingiu aos meios novos tecnológicos a mesma conotação para fins de subordinação jurídica dos meios pessoais já existentes, portanto, denota-se que a lei veio adequar a nova situação trazida pela tecnologia as normas já existentes anteriormente, não podendo ser interpretada como norma que trata de sobreaviso. Interpretar a modificação do art. 6º da CLT como norma que trata do sobreaviso, levaria ao absurdo de entender que conceder um  aparelho celular ou tablet ao empregado e este por apenas portar fora de serviço ou utilizar em interesses particulares , constituiria tempo à disposição do empregador, o que transformaria os avanços na relação empregatícia em tormentos para os empregadores.

Como o trabalhador que, fora do expediente, permanece conectado ao empregador por meio de aparelhos eletrônicos (BIP, pager, celular), pode se deslocar para onde bem entender, não se aplicaria o regime de sobreaviso. Este é o entendimento do TST, mantido depois de uma semana de discussões no mês de maio do ano passado.

A Lei nº 12.551/2011  tem o intuito de encerrar a polêmica a respeito da subordinação à distância,pois tentou estabilizar a relação jurídica no segmento do teletrabalho, no tocante à caracterização da relação de emprego.

Destarte, entendo que não se confundem os intuitos das normas, ou seja, a nova redação do art. 6º da CLT, que explicita a configuração do teletrabalho subordinado, não contraria, necessariamente, a tese de que o empregado não faz jus ao regime de sobreaviso na hipótese da Súmula 428.

Exemplificando, o fato de um empregado ter a sua disposição um telefone celular ou um tablet para fins de trabalho ou ainda que este funcionário preste o trabalho a distância, não significa que quando esteja passeando,  fora do seu horário de trabalho, e esteja com o telefone ligado ou  com seu tablet conectado a internet, possamos entender que ele  faça  jus  ao sobreaviso(previsto no Art. 4º da C.L.T[1]). em virtude da alteração do art. 6º da CLT. Interpretar desta  forma, levaria ao absurdo de se considerar o empregado como à disposição do empregador (stricto sensu, ou seja, nos termos do art. 4º da CLT) em virtude da obrigação de portar o celular ligado ou tablet, devendo o empregado receber a remuneração pelas 24 horas do dia (sendo oito simples, uma de intervalo não remunerado, e quinze horas extras)???  E a limitação da duração do trabalho???

O regime de sobreaviso deve ser configurado quando existe sim os elementos de fiscalização por meios eletrônicos e estes sejam efetivamente utilizados e não a mera disponibilização, pela empresa,  de aparelhos eletrônicos ao empregado.

Por fim, é necessário interpretarmos a norma de forma ampla, porém, acautelar-se nos meandros que possam infligir a norma, com a nova redação do art. 6º, pois o intuito pode ser desvirtuado, gerando um retrocesso na relação existente entre a tecnologia e as relações trabalhistas. Devo salientar que a tecnologia veio para auxiliar nas relações de trabalho e não para imputar punições de ordem legal aos seus usuários.



[1] ( Art. 4 º-Considera-se como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada)